quarta-feira, 7 de julho de 2010

A Concepção do Sistema e a Hermenêutica Constitucional

A hermenêutica dos dispositivos constitucionais precisa, a priori, observar a Constituição em sua unidade, a fim de que se possa dotá-la de coerência. Assim se expressa CANOTILHO ao discorrer a respeito: “O princípio da unidade da constituição ganha relevo autónomo como princípio interpretativo quando com ele se quer significar que a constituição deve ser interpretada de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre suas normas”.

Na atividade de busca do sentido de uma norma de objeto aberto como a norma constitucional (jurídico-político), que reflete o conjunto de valores de uma dada sociedade, num determinado momento de seu processo histórico, preponderante é o papel do intérprete, enquanto inserido nesse contexto histórico.

É inafastável à ciência jurídica o componente axiológico, que bem pode ser demonstrado através da completa impossibilidade de separá-lo do ser humano, já que, por ser a única espécie dotada de raciocínio, não pode realizar um pensamento sequer, que não esteja em consonância com seus valores. Dessa forma, magistral a lição de MARCELO NEVES a respeito: “Os dogmas da completude e do fechamento apresentam-se mais evidentemente insustentáveis, se se considera o ordenamento jurídico do ponto de vista semiótico, em suas dimensões sintática, semântica e pragmática. Embora sintaticamente, onde não haja norma geral includente e se revele a norma geral excludente, possa sustentar-se a completude e o fechamento do ordenamento jurídico, a abordagem semântico-pragmática revela-lhe a carência da completude e, conseqüentemente, o caráter aberto. E se o problema da completude jurídica, assim como o do fechamento, não é lógico-sintático, mas fundamentalmente semântico e, diríamos nós, pragmático, a completabilidade e a abertura são conceitos mais adequados à caracterização do ordenamento jurídico, enquanto sistema nomoempírico prescritivo: 1) há relações interpessoais que não estão previstas no ordenamento jurídico, mas se submetem muitas vezes a uma decisão dos órgãos jurisdicionais (aspecto semântico da complementaridade); 2) os emitentes e destinatários das normas jurídicas têm expectativas que não encontram correspondência no interior do ordenamento jurídico (aspecto pragmático da complementaridade); 3) o ordenamento jurídico funciona em intercâmbio com os demais subsistemas sociais (aspecto semântico da abertura); 4) o ordenamento condiciona e é condicionado pelos fins e ideologias dos emitentes e destinatários, nos atos de produção, interpretação e aplicação jurídicas (aspecto pragmático da abertura)”.

Princípios e regras interpretativas das normas constitucionais:

“- da unidade da Constituição: a interpretação constitucional deve ser realizada de maneira a evitar contradições entre suas normas;

- do efeito integrador: na resolução dos problemas jurídico-constitucionais, deverá ser dada maior primazia aos critérios favorecedores da integração política e social, bem como ao reforço da unidade política;

- da máxima efetividade ou da eficiência: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda;

- da justiça ou da conformidade funcional: os órgãos encarregados da interpretação da norma constitucional não poderão chegar a uma posição que subverta, altere ou perturbe o esquema organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido pelo legislador constituinte originário;

- da concordância prática ou da harmonização: exige-se a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros;

- da força normativa da constituição: entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais.”
CANOTILHO


“- a contradição dos princípios deve ser superada, ou por meio da redução proporcional do âmbito de alcance de cada um deles, ou, em alguns casos, mediante a preferência ou a prioridade de certos princípios;

- deve ser fixada a premissa de que todas as normas constitucionais desempenham uma função útil no ordenamento, sendo vedada a interpretação que lhe suprima ou diminua a finalidade;

- os preceitos constitucionais deverão ser interpretados tanto explicitamente quanto implicitamente, a fim de colher-se seu verdadeiro significado.”

JORGE MIRANDA

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