Em decorrência da supremacia da Constituição sobre o ordenamento jurídico de um Estado, e da rigidez das normas constitucionais, especialmente as que tutelam direitos fundamentais, necessário o controle da compatibilidade das disposições infraconstitucionais com o texto constitucional.
OBSERVAÇÃO 1: ALEXANDRE DE MORAES classifica a CF/88 como super-rígida, vez que em regra poderá ser alterada por um processo legislativo diferenciado, mas, excepcionalmente, apresenta alguns dispositivos imutáveis, as cláusulas pétreas, também chamadas de núcleo constitucional sensível ou intangível, previstas no § 4º do art. 60: "§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais." (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 10.)
OBSERVAÇÃO 2: No atual estágio da ciência do Direito, as soberanias dos Estados vêm perdendo relevância, desde a criação da ONU, após a Segunda Guerra Mundial, de forma que no plano internacional, os tratados sobre direitos humanos, desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1.948; a Convenção contra o genocídio, como reação ao nazismo, de 10/12/1.948, que já previa a criação do Tribunal Penal Internacional, ocorrida no final dos anos noventa; o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1.958; a Convenção contra a discriminação racial de 1.965, que empresta a dignidade de sujeito ao ser humano no Direito Internacional; a Convenção dos direitos das mulheres de 1.979; e a Convenção contra a tortura de 1.984 constituem o denominado "núcleo duro dos direitos humanos" ou o "JUS COGENS", de observância obrigatória por toda a humanidade. EUA, Reino Unido, França, Rússia e China, por serem membros permanentes, possuem poder de veto no Conselho de Segurança da ONU, nos termos do art. 23, c/c o art. 27.3 da Carta da ONU, com a alteração procedida em 17 de dezembro de 1963: "O Conselho de Segurança será composto de quinze Membros das Nações Unidas. A República da China, a França, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do norte e os Estados unidos da América serão membros permanentes do Conselho de Segurança. (...) As decisões do Conselho de Segurança, em todos os outros assuntos, serão tomadas pelo voto afirmativo de nove membros, inclusive os votos afirmativos de todos os membros permanentes, ficando estabelecido que, nas decisões previstas no Capítulo VI e no parágrafo 3 do Artigo 52, aquele que for parte em uma controvérsia se absterá de votar."
OBSERVAÇÃO 3: a República Federativa do Brasil aderiu voluntariamente à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, nos termos do Decreto Nº 4.388/2002, fato que motivou a adição do § 4º ao art. 5º da CF, através da EC 45/2004, com o seguinte teor: "§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão."
OBSERVAÇÃO 4: a sociedade global exige a proteção de direitos que extrapolam as fronteiras dos estados nacionais, e têm provocado a perda da relevância da soberania estatal enquanto paradigma de juridicidade, como, por exemplo, direito à paz universal, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direitos humanos, no plano internacional, no plano interno de cada Estado, de quinta dimensão, após os prévios, direito à liberdade, à igualdade, à fraternidade ou solidariedade e à democracia, direitos de primeira, segunda, terceira e quarta dimensões respectivamente.
OBSERVAÇÃO 5: a República Federativa do Brasil incorpora como emendas constitucionais os tratados de direitos humanos cuja aprovação ocorrer conforme o procedimento previsto no § 3º do art. 5º da CF, também acrescentado pela EC 45/2004: "§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais."
OBSERVAÇÃO 6: os demais tratados internacionais ratificados pelo Brasil, que versem sobre direitos humanos, mas não tenham sido aprovados na forma prevista no § 3º do art. 5º da CF/88, incorporam-se ao ordenamento jurídico nacional com status supralegal, ou seja, superior à Lei e inferior à Constituição, conforme a alteração da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 466.343/SP, por apertada maioria de cinco contra quatro votos. A Ementa abaixo transcrita explica melhor a questão, ao aplicar o § 2º do art. 5º da CF/88: "DIREITO PROCESSUAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL. PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA. ALTERAÇÃO DE ORIENTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. A matéria em julgamento neste habeas corpus envolve a temática da (in)admissibilidade da prisão civil do depositário infiel no ordenamento jurídico brasileiro no período posterior ao ingresso do Pacto de São José da Costa Rica no direito nacional. 2. Há o caráter especial do Pacto Internacional dos Direitos Civis Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7°, 7), ratificados, sem reserva, pelo Brasil, no ano de 1992. A esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação. 3. Na atualidade a única hipótese de prisão civil, no Direito brasileiro, é a do devedor de alimentos. O art. 5°, §2°, da Carta Magna, expressamente estabeleceu que os direitos e garantias expressos no caput do mesmo dispositivo não excluem outros decorrentes do regime dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. O Pacto de São José da Costa Rica, entendido como um tratado internacional em matéria de direitos humanos, expressamente, só admite, no seu bojo, a possibilidade de prisão civil do devedor de alimentos e, conseqüentemente, não admite mais a possibilidade de prisão civil do depositário infiel. 4. Habeas corpus concedido." (HC 95967, 2ª Turma, v.u., j. 11.11.2008).
OBSERVAÇÃO 7: Em matéria de direitos humanos, deve ser aplicada a norma mais favorável, seja a do direito interno do Estado, ou a expressa nos tratados internacionais sobre direitos humanos, consoante lição do Min. Celso de Mello, relator do precedente cujo extrato da Ementa segue abaixo transcrito, e prolator do Voto Vencido no RE 466.343/SP acima citado: "HERMENÊUTICA E DIREITOS HUMANOS: A NORMA MAIS FAVORÁVEL COMO CRITÉRIO QUE DEVE REGER A INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. - Os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele proclamado no Artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos), consistente em atribuir primazia à norma que se revele mais favorável à pessoa humana, em ordem a dispensar-lhe a mais ampla proteção jurídica. - O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornarem-se palavras vãs. - Aplicação, ao caso, do Artigo 7º, n. 7, c/c o Artigo 29, ambos da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica): um caso típico de primazia da regra mais favorável à proteção efetiva do ser humano." (HC 90450, 2ª Turma, v.u., j. 23.09.2008)
OBSERVAÇÃO 8: no sistema regional de proteção dos direitos humanos, conforme os precedentes dantes citados, assume especial destaque a Convenção Americana de Direitos Humanos, o Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil, sem reservas, através do Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992.
OBSERVAÇÃO 9: a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou a República Federativa do Brasil a instaurar "Comissões da Verdade" para apurar os crimes contra a humanidade cometidos durante a Guerrilha do Araguaia, não alcançados pela Lei de Anistia; a criar o tipo penal específico para o terrorismo; e, em consequência, indenizar a família das vítimas, conforme sentença de 24 de novembro de 2010, em contraponto à decisão proferida pelo STF, no julgamento da ADPF 153/DF, em 29 de abril de 2002, que por 7 votos a 2, validou a Lei de Anistia: "VI. CONCLUSÃO 30. Finalmente é prudente lembrar que a jurisprudência, o costume e a doutrina internacionais consagram que nenhuma lei ou norma de direito interno, tais como as disposições acerca da anistia, as normas de prescrição e outras excludentes de punibilidade, deve impedir que um Estado cumpra a sua obrigação inalienável de punir os crimes de lesa-humanidade, por serem eles insuperáveis nas existências de um indivíduo agredido, nas memórias dos componentes de seu círculo social e nas transmissões por gerações de toda a humanidade. 31. É preciso ultrapassar o positivismo exacerbado, pois só assim se entrará em um novo período de respeito aos direitos da pessoa, contribuindo para acabar com o círculo de impunidade no Brasil. É preciso mostrar que a Justiça age de forma igualitária na punição de quem quer que pratique graves crimes contra a humanidade, de modo que a imperatividade do Direito e da Justiça sirvam sempre para mostrar que práticas tão cruéis e desumanas jamais podem se repetir, jamais serão esquecidas e a qualquer tempo serão punidas." X "LEI N. 6.683/79, A CHAMADA "LEI DE ANISTIA". ARTIGO 5º, CAPUT, III E XXXIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL; PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E PRINCÍPIO REPUBLICANO: NÃO VIOLAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS HISTÓRICAS. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E TIRANIA DOS VALORES. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E DISTINÇÃO ENTRE TEXTO NORMATIVO E NORMA JURÍDICA. CRIMES CONEXOS DEFINIDOS PELA LEI N. 6.683/79. CARÁTER BILATERAL DA ANISTIA, AMPLA E GERAL. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA SUCESSÃO DAS FREQUENTES ANISTIAS CONCEDIDAS, NO BRASIL, DESDE A REPÚBLICA. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E LEIS-MEDIDA. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES E LEI N. 9.455, DE 7 DE ABRIL DE 1997, QUE DEFINE O CRIME DE TORTURA. ARTIGO 5º, XLIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO E REVISÃO DA LEI DA ANISTIA. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 26, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1985, PODER CONSTITUINTE E "AUTO-ANISTIA". INTEGRAÇÃO DA ANISTIA DA LEI DE 1979 NA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL. ACESSO A DOCUMENTOS HISTÓRICOS COMO FORMA DE EXERCÍCIO DO DIREITO FUNDAMENTAL À VERDADE."
Representação da nova pirâmide jurídica conforme a jurisdição internacional sobre os direitos humanos.
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